O sangue que me corre às veias, não é sangue
O ar que me invade como lança, não é ar
A água que bebo, o som que ouço, a cor que vejo
Não são água, som ou cor
Corre-me pelas veias lava, incadescente
Como que num vulcão esperando
O ponto exato da ebulição
O jorro certeiro do ferro em fogo
Este ar é chama, é labareda
Que, sem intervalo sequer a sustentar,
Me corrompe pulmões e alma
Enegrecendo, com pressa, sem calma
Até o suspiro das cinzas que expiro
A água é aço líquido e turvo
E endurece todo o livre espírito
Que antes pairava, flutuante
Sonhador das simples coisas do amar
Cor, arco iris, flor, paisagem
São palavras, letras, símbolos.
Hoje, a ausência de cor torna-me negra
Sêca de toda paleta vibrante que antes
Vivia por respirar
E não há salvo-conduto nesse trecho de vida
Pois perco-me sem passagem, sem caminhos
Sem destino, sem carinho
Sem luar, sem violão...
Como miragem, atinjo seus olhos
E busco com os meus um alívio às dores
Que ainda carrego sobre os ombros pesados.
E eles desviam, solenes, descrentes
Como a murmurar caprichos indecifráveis.
Percebo o muro que se fecha em ferro e fogo
Lacrando o que não se começa
O que não se apressa
O que sequer existiu:
A Promessa da Vida que não se cumpriu.
Volto ao luto por minha lucidez
Para que se corra sangue, ar, água, som e cor.
No dourado escrínio de minhas lembranças.
Sabedora que sou de minha força e grito
Vejo reerguer-me vagarosamente
Silenciosa e tristemente
Novamente em busca de mim.
Há uma lava, um sangue tortuoso, sinuoso, fervente aí dentro, lavando e rompendo tudo, Ana. Que poema forte... ferveu aqui rs rs. Parabéns, amiga. beijos.
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